sábado, 27 de novembro de 2010

UMA MATÉRIA COM A VISÃO DE UM REPÓRTER DE VERDADE

sexta-feira, 26 de novembro de 2010


O atestado de óbito de uma política de segurança baseada na criminalização das comunidades pobres

“Isso é uma guerra. É uma guerra e guerra tem de ser enfrentada como guerra. Direitos humanos devem ser respeitados sempre, é nossa filosofia, Mas isso é uma guerra”.
Sérgio Cabral, 11 de novembro de 2007.

Quase 20 ônibus foram incendiados nos últimos dias nessa onda de ataques
Como no filme TROPA DE ELITE 2 (obra prima do cinema nacional que você não pode deixar de ver) essa interminável sequência de desafiadores ataques criminosos, responsáveis por um clima de pavor generalizado no Estado do Rio de Janeiro, é, antes de mais nada, o atestado de óbito da política de segurança do governador Sérgio Cabral, que engabelou muitos cidadãos ingênuos com a idéia de que assegurava proteção aos burgos com a ocupação policial de algumas favelas, enquanto bancava a tática dos confrontos e o patrocínio da maior matança de jovens das comunidades pobres.
Essa política parte do princípio de que a um cidadão apavorado serve-se o cardápio da SENSAÇÃO de segurança como calmante para seus nervos à flor da pele. A violência urbana pode continuar em alta, mas a notificação da presença policial em algumas comunidades pobres e criminalizadas, numa declarada disputa de territórios, sugere o bloqueio de redutos e a imobilização do “poder paralelo”, com a consequente redução da criminalidade.
A essa cortina de fumaça adiciona-se o espetáculo da matança em pencas, como aconteceu no Complexo do Alemão, em 2007 (convém ler o Relatório do Comissário da ONU, Philip Alston, sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias no Rio de Janeiro) e a sucessão de massacres na favela da Coréia, em Senador Camará.
Marginais mostram sua força
Fosse real e consistente o método usado para dourar essa míope e desastrada “política de segurança”, isso que está acontecendo agora, no portal do período natalino, não poderia ter chegado ao ponto que chegou. O governo estadual, com todo o apoio do federal, teria “cortado as linhas inimigas”, reduzindo o seu poder de fogo e instalando feixes de proteção sobre os bairros do asfalto.
No entanto, temos neste momento uma população acuada, atacada por todos os flancos e exigindo que se faça qualquer coisa, que se mate qualquer suspeito, enquanto um sistema policial desmoralizado e em pandarecos pede ajuda pelo amor de Deus às Forças Armadas, que, pela primeira vez, fugindo à sua finalidade constitucional, põem seus tanques em favelas planas e oferece o escopo de uma guerra efetiva contra focos da delinquência selecionados no palpite, que permaneceriam intocados se as cidades da região metropolitana não tivessem sido atacadas em insólitas ações incendiárias.
É claro que estamos num momento de grande comoção, com a virtual paralisação das atividades nas urbes afetadas e a disseminação de um sentimento de impotência e revolta entre os cidadãos. O que todos querem de cara, enfatizo, é ver o fim imediato dessa beligerância e a punição sumária dos responsáveis por esse estado de choque que afeta a quase todo mundo.
E é provável que as forças da repressão ofereçam as cabeças cortadas de centenas de suspeitos, em atos compensatórios que serão aplaudidos freneticamente.
Por que negaram educação de verdade aos pobres
Mas nada disso representará o restabelecimento do mínimo de segurança da população. Se o ódio de classe e a hegemonia das elites racistas e excludentes não tivessem triunfado sobre a estratégia de Leonel Brizola e Darcy Ribeiro, se desde aquele 1983 os governos tivessem investido em massa nos CIEPs, as escolas de tempo integral, oferecendo carinho e conhecimento aos meninos pobres, se as áreas marginalizadas das cidades não fossem vistas apenas como “santuários do crime” e currais eleitorais de políticos canalhas, certamente não teríamos chegado a esse ambiente de guerra de desdobramentos imprevisíveis.
Ao contrário, a visão lúcida de Brizola foi usada contra ele com a chancela de uma mídia entre empresarial e superficial, mídia que exibe diariamente pela televisão centenas de mortes em filmes que glamorizam o crime.
Prevaleceu a política da matança “exemplar”, com incursões programadas nas áreas onde moram milhares de trabalhadores que não podem pagar o alto custo da habitação num país em que os bancos controlam o sistema imobiliário e remetem quem ganha pouco para os barracões dos morros e da beira-rio.
Sérgio Cabral transformou a suposta defesa dos cidadãos pacatos numa guerra declarada de disputa de territórios. Num mata-mata que vitimou também muitos policiais e confinou a responsabilidade da segurança nos limites bélicos, envernizados pelas tinturas do ódio de classe: vencerá quem tiver mais bala na agulha, quem dominar mais territórios nos morros e nas zonas proletárias.
A farsa da ocupação de algumas favelas
Cabral investiu nas vitrines pontuais e tentou fazer acreditar que estava semeando proteção aos cidadãos com as suas UPPs. A bem verdade, seu abre-alas é uma farsa picaresca. Refiro-me, sim, ao espetáculo das festejadas unidades de polícia pacificadora.
Pelo noticiário de uma mídia que morre de medo do morro, esses grupos policiais teriam livrado doze comunidades do domínio do tráfico. O que aconteceu, de fato, foi uma espécie de acordo virtual: a “rapaziada” trocou a exibição de seu armamento pelo “sapatinho” e continuou vendendo seus tóxicos. Nenhum “chefão” dessas áreas ocupadas foi preso. Aliás, quase ninguém saiu de circulação – apenas caiu na clandestinidade consentida.
Mas a meninada sem atenção familiar adequada, em número cada vez maior,  continuou tendo onde pegar sua droga. Até o “delivery” e as vendas pela internet foram implantados com sucesso. Em suma, se o objetivo fosse fechar o mercado, tal não aconteceu.
Veja um exemplo: na terça-feira passada, policiais da delegacia da Taquara prenderam 11 integrantes de uma quadrilha de 21 traficantes, que enviavam drogas da Cidade de Deus (segunda comunidade “pacificada”) para o complexo do Alemão. Todos os presos moravam e operavam no antigo conjunto favelizado de Jacarepaguá.
Mesmo que tivesse cessado o comércio de drogas nas áreas ocupadas pela polícia, isso não produziu nenhum efeito real sobre a cidade: os criminosos continuaram praticando seus assaltos, matando e levando pânico, principalmente nas grandes vias de acesso e na adoção de práticas novas, como o sequestro do cidadão para suas próprias casas, onde fazem a limpa e saem levando um refém até escaparem em direção aos seus redutos: no caso de Jacarepaguá, onde esse tipo de assalto prolifera, os bandidos fazem questão de informar que são da Cidade de Deus.
A matança dos jovens das favelas não reduziu a criminalidade
Para reforçar mais essa SENSAÇÃO de segurança, o governador Sérgio Cabral deu continuidade com maior ênfase à matança de jovens dessas áreas, sempre com o registro de “auto de resistência”.
Com isso, o Rio de Janeiro galgou um patamar olímpico: a polícia fluminense mata por ano mais pessoas em “confrontos” do que todas as 21 mil corporações dos Estados Unidos, segundo revelação do Centro de Estudos de Segurança e Cidadania.
No governo de Sérgio Cabral, a polícia radicalizou: já entra nas favelas atirando no primeiro suspeito. Isso representou um aumento de 30% de jovens e adolescentes mortos nas comunidades pobres em relação a 2006.
Se compararmos com oito anos atrás, a diferença é brutal: os dados oficiais do Instituto de Segurança Pública registraram 1.186 mortos em “autos de resistência” de janeiro a dezembro de 2007. Em 1999, as mortes nessa rubrica foram de 299 jovens e adolescentes.
Sob Cabral, patrocinador da "política de enfrentamento", foi atingida a marca de 147 mortes praticadas por policiais em um mês, quase cinco por dia. Isso ocorreu seguidamente em abril e maio de 2008. Foi o ápice dos autos. Segundo pesquisa do IPEA, encomendada pela Assembléia Legislativa, em 2008 a polícia do Rio prendeu 23 pessoas para cada morte em autos de resistência. Em São Paulo, foram 348 prisões para cada morte. Nos Estados Unidos, essa média é de 37 mil prisões para cada caso de resistência seguida de morte.
Essa política de extermínio não reduziu a criminalidade. Para cada suspeito morto, há três na fila desse emnprego macabro.
Sem essa de perda de território
Não é apenas essa sequência de assassinatos perpetrado pelos agentes da Lei que levou a essa reação dos bandidos. Nem também “a perda de territórios”, como alega Cabral. De fato, neste caso, as grandes favelas permanecem fora da planilha: Rocinha, Complexo do Alemão, Jacarezinho, Manguinhos, Complexo da Penha, Vila Vintém, Rebu, entre outros não estão nos planos de ocupação, pelo menos por agora.
Nessas áreas, a polícia prefere as incursões ocasionais de extermínio. O populoso Complexo da Maré, ao longo da Avenida Brasil, ganhou até um Batalhão, que fica de frente para a Linha Vermelha: e, no entanto, nada mudou, ou mudou para pior: há uma semana, policiais da Ilha do Governador trocaram tiros com quatro PMs da Maré, que estavam num carro roubado. E a Linha Vermelha conrinua sendo uma das mais vulneráveis vias de risco.
Tudo isso tem a ver com uma espécie de “radicalização de hábitos” dos criminosos e também com a revolta diante da transferência de seus parceiros para presídios federais distantes, sem o respeito à Lei das Execuções Penais (por conta de um acordo extra-judicial do governo do Estado com o Tribunal de Justiça).
Sob certo aspecto, tocar fogo num carro estacionado, incendiar um ônibus dessas empresas que mandam e desmandam na Prefeitura, prestando péssimos serviços à população, é uma variável de viés político. O governador proclamou o combate ao crime como uma guerra – os bandidos pegaram a deixa e partiram para a sua própria “guerra de guerrilha”, onde exibem uma alarmante onipresença, deixando todo mundo sem saber onde há um porto seguro.
Daqui para frente, enquanto tiverem pessoal disponível, os marginais vão causar pesados prejuízos às cidades fluminenses, que dependem agora da mão forte das forças federais. A polícia do Estado perdeu essa guerra, até porque nunca teve esse combate sob uma ótica decente – todo mundo sabe que é difícil encontrar um policial  realmente disposto a ser um “capitão Nascimento”.
Espero que você não ache que estou escrevendo para justificar essa onda assustadora de ataques a carros e ônibus, que levou O GLOBO a dedicar hoje todo um caderno especial ao assunto. E que fez esse mesmo jornal comparar a participação de alguns tanques dos Fuzileiros Navais ao desembarque que mobilizou 3 milhões de soldados dos Estados Unidos, Inglaterra e Canadá na Normandia, naquele  decisivo 6 de julho de 1944, durante a II Guerra Mundial.
Apavorado, qualquer um perde a tranquilidade e a capacidade de raciocinar. Mas se você ainda tem condição de pensar, ponha-se no seu próprio lugar e recorra aos seus conhecimentos de lógica: Cabral está pagando por sua miopia, por sua incompetência, por sua vocação elitista. Cidades estão paralisadas e nossa sorte depende agora de uma intervenção federal de fato, a mesma que o agora deputado eleito pelo PDT, Sérgio Zveiter, queria, quando presidente da OAB, para afastar Brizola do governo do Estado, na década de 90.
Esta matéria foi extraída do Blog Porfírio Livre, após um e-mail que recebí dele. Estou muito feliz de na atualidade, com vários "especialistas" fazendo comentários ridículos, com viés políticos ou em ato de estrelismo ou mesmo, movidos por emoção, poder ler uma matéria com tanta lucidez e responsabilidade, como esta. A nossa população, tão sofrida e enganada, aplaude a ação desesperada das forças culpadas por este estado de guerra, pois não podem mais andar na cidade, mais bela do país e também a mais vendida para o narcotráfico como a nossa, com bocas de fumo e traficantes atuando a anos ao lado dos Batalhôes e Delegacias.
Que após estes dias não só os traficantes fiquem presos, mas também todos os Comandantes e comandados envolvidos direta ou indiretamente, na venda destes territórios, que sejam encarceirados, pois também vivem a margem da lei.
Que Deus nos ajude!

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